Construída em 1973, a rodoviária de Fortaleza é um dos prédios mais icônicos da cidade e constitui um dos mais importantes patrimônios da arquitetura modernista do Ceará. O prédio vem sendo estudado e referenciado em diversos estudos arquitetônicos estando listado no Guia de Arquitetura Moderna de Fortaleza. Recentemente o edifício foi publicado no maior portal de arquitetura do Brasil como referência para as novas gerações de arquitetos.
“No final do ano de 1969, a convite do então prefeito Municipal de Fortaleza, Engenheiro José Walter Cavalcante, fui incumbido de idealizar e projetar o primeiro terminal rodoviário de Fortaleza, que na inauguração em 1974 recebeu o nome do notável engenheiro João Thomé. A minha primeira procedência frente ao tamanho do desafio foi viajar à cidade do Rio de Janeiro, onde se inaugurava o terminal “Novo Rio”, na época, paradigma da visão nova de terminais rodoviários.
De volta, aprofundei as pesquisas com os órgãos responsáveis pelas estatísticas dos transportes interestaduais e municipais. Muito pouco ou quase nada aferi dos levantamentos, deixando-me dúvidas quanto ao futuro crescimento das empresas transportadores, era difícil, portanto, realizar um projeto comprometido com as gerações autotransportados do futuro. Estes obstáculos de informações direcionaram a concepção do futuro terminal para a alternativa de uma arquitetura celular, cujos módulos seriam acrescidos indefinidamente aos já construídos, sem solução de continuidade estética, funcional ou mesmo do uso e serviços ao terminal.
Mas… qual seria a peça mágica estrutural?
A solução foi mágica e rápida. A inspiração reportou-se às reminiscências da infância. Nascido na singela cidade de Ipu, nos flancos areníticos da cordilheira, convivendo com a escala monumental das pedras e das águas caindo da serra Ibiapaba, estava criado o cenário perfeito que moldurou o espírito de criação do arquiteto. O vale fértil do riacho Ipuçaba, serpenteando sítios, cidades e povoados, deixa um imenso cordão verde e perene em suas ribeiras ricas de húmus e vida. Neste palco da natureza, nasce entre tantos outros, o majestoso sítio do Gagão, confinado entre a urbe e o grotesco talhado, desfrutado por visitantes quase diariamente ou nos alegres folguedos de fim de semanas. O Gagão deixou vivas as lembranças do imponente “salão das mangueiras”, espaço ensombrado e sem limites, enquanto, colunatas robustas sustentam o teto das copas redondas de folhagem verde escuro. Bem do alto o sol invade os espaços dos copas deixando, clareado o chão do “salão”, coberto de folhagens mortas e tênue relvado. Estava ai construído pela natureza o espaço que insinuava o novo terminal.
O processo de concepção do terminal rodoviário induzia a estilização do bosque extraído das recordações da infância. As arvores agora esculpidas no concreto, chama-se de paraboloide-hiperbólicos, que passam a cobriu cada um uma área de 287m²Os módulos localizados lado a lado projetam nas arestas livres da cúpula a luminosidade solar incidindo sobre o piso do salão. Localizado e construído em terreno fértil de mangueiras, o terminal está há 27 anos funcionando na avenida Borges de Melo.
Hoje, o terminal rodoviário Engenheiro João Thomé prima pela originalidade da concepção e função orgânica da arquitetura. Evoca as origens de tantos quantos que por lá passam e passam também lembranças de suas meninices, ora transportadas em ônibus para as viagens de reminiscências de tempos passados, talvez nas mesmas lembranças de sítios de canções iguais de paisagens verdes e felizes como o sonho da criança.”
Texto por Luciano Marrocos Aragão